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Em Desconstrução

É fascismo. Precisamos chamar pelo nome -- e combatê-lo

Rodrigo Ratier

28/04/2018 12h31

Manifestantes protestam no acampamento Marisa Letícia, que reúne apoiadores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Divulgação)

 

Descemos mais um degrau rumo ao inacreditável. O atentado a balas ao acampamento de apoio a Lula, em Curitiba (PR), deixou dois feridos. É um novo patamar na escalada da violência política. Do discurso de ódio nas redes sociais passou-se à ação prática — e isso não é uma transição trivial. Muitos de nós já imaginamos querer matar alguém. Alguns chegam a verbalizar o desejo. Raríssimos, até aqui, efetivamente puxavam o gatilho.

Agora puxam.

Isso tem nome e precisa ser enunciado com coragem. Fascismo. Exagero? Penso que não. É verdade que o radicalismo político autoritário que originou o termo na Europa do início do século 20 tinha um feixe de aspectos que não necessariamente estão presentes aqui: nacionalismo, centralização de poder em Estado forte, chefes carismáticos. Considero um equívoco identificar o fascismo apenas em movimentos que preencham esse checklist. Existem fascismos e fascismos, mas uma característica sempre se apresenta: o uso de ações para o extermínio político e físico dos adversários.

Chegamos a esse ponto por aqui. Lula já está preso, mas isso não basta a certos opositores. É preciso eliminar o outro lado. A ascensão das dinâmicas fascistas não está vindo sem aviso. A caravana do ex-presidente pela região Sul do país visibilizou seus diversos métodos, que conforme o cortejo avançava aumentavam seu poder de letalidade: ovos, paus, pedras, chicotes — de simbologia tristíssima a evocar nosso passado colonial –, revólveres. Agora, as primeiras vítimas.

O poder público tem sido lento em coibir e combater a violência política. Marielle morreu há um mês e meio. O ônibus da caravana do ex-presidente sofreu atentado em 27 de março. O acampamento pró-Lula foi removido das cercanias da Polícia Federal por ordem judicial, que determinou o novo local sem que houvesse segurança adequada, como se vê agora. O que mais falta acontecer?

Há ideias em circulação que mascaram a gravidade do momento atual. "Foram eles que começaram": dilema do tipo "o ovo ou a galinha" (sempre será possível identificar a gênese no "outro lado") que desvia do objetivo principal — o combate à radicalização violenta. "Colheu o que plantou": derivação do pensamento anterior que culpabiliza a vítima e que desconsidera o abismo que existe entre a agressividade no discurso e as práticas fascistas concretas. "Chamar de fascistas vai afastar essas pessoas do debate": o diálogo tem regras. Que tipo de conversa é possível travar com quem atua para matar? Discussão pede respeito ao adversário e o mais básico de todos é o respeito pela vida.

A ascensão no Brasil dos radicalismos violentos é o que é: fascista. É preciso chamá-los pelo nome e combatê-los. A história mostra que o preço da omissão será incalculável.

Sobre o autor

Rodrigo Ratier é jornalista, professor universitário, pai de duas, curioso pela vida, entusiasta do contraditório

Sobre o blog

Olhares e provocações sobre a vida cotidiana: família, trabalho, amizade, educação, cultura – e o que vier pela frente

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